terça-feira, fevereiro 21, 2006

Completo enfim

Completaste um ciclo inteiro
agora é hora de voltar
caminhaste em um pesadelo
é hora de acordar.

Leva contigo um sonho
o cante aonde for
ao cruzar com o desespero
o encante com um tom menor.

O recinto

Com um gosto amargo na boca
e um quase nada de foco nos olhos
viro pro lado sereno
contemplo a parede branca
pedindo um afago sincero
sincero como eu nunca serei.

Guiado pelos rejuntes do piso
escorro recinto adentro
alcanço a tomada da sala
foi-se embora a luz.

É a travessia mais densa
que um dia já enfrentei
os metros quadrados
se fazem vales imensos
eternos
e a tristeza se vale do tempo
que por tempos não passa
pra aumentar o tamanho das coisas.

quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Tecnologia

Meu coração está guardado no freezer
sob forte e sempre intensa refrigeração
o sangue que em meu corpo circula
é bombeado por máquinas pesadas
as quais arrasto pelo chão.

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Realidade suspensa

A conexão local caiu
verifique se estão ligados
todos os cabos de rede
se o problema persisitir
contate o seu provedor.

Pólo sujo

Fabricam de forma barata
chinelos, sandálias e afins
num pólo industrial fumacento
distante exatas cem milhas daqui.

terça-feira, fevereiro 07, 2006

Se afoga no ar

Se afoga no ar
pra não ter mais certeza de nada
o vento que sopra aqui
trás um dia molhado de sol...

...e mesmo que chova forte depois
o sol vai brilhar
por entre as nuvens de gente e rostos perdidos
e o tempo...

...vai parar.

Sambinha em mi

Te dizer
que eu me odeio bem mais
que você
possa vir me amar um dia.

Sinto pouco em te dizer
quase nada, enfim
vou me embora sem você
por favor
se esqueça de mim.

Poeminha tolo

Acendi a luz da sala
que é pra enxergar melhor
o hálito que me aquece
no fundo da sua boca.

Oração às diferenças

Odeio você em nome de Deus.

Doutor Osório

Outrora atuando nas fronteiras de uma guerra fantástica
se refugia agora com as portas trancadas
o bom e velho Doutor Osório
num antigo porém bem conservado laboratório.

Um silencioso recinto
propício ao intelecto e pesquisas diversas
lugar excelente pra devaneios científicos
experimentos secretos e idéias perversas.

domingo, fevereiro 05, 2006

Ritmo lento

As nuvens me alcançaram assim
finalmente os pés
depois de anos.

Na rua lá embaixo

Certo dia, discutindo bobagens com Deus
na sacada do meu apartamento alugado
me apareceu um moleque alado
com asas escuras e um bico mudo
ouvindo a conversa
fazendo pose pra sair na foto.

Pulou pra dentro da sala, abriu a porta da frente
desceu correndo a escada finita
coberta por degraus tortos
chegando ao térreo de concreto frio
levou lambida de policial
por levar fumo de bobo no bolso.

sábado, fevereiro 04, 2006

Antes das quatro

Acorda sempre tristonho
sob o olhar tênue das borboletas
pausadas no arbusto de seu jardim
cientes de ter um único dia para voar.

Desperto em melodias cíclicas
caminha por entre edifícios cinzas
duros como o mal amar
procurando fendas no asfalto
um lugar seguro para depositar
moedas, sentimentos e quetais.

Folha secas

Foram tantas as folhas caídas que ele havia contado
até aquele exato momento
em que a música parava
que chegou realmente a pensar:
poderia caber o universo inteiro
ao longo dos galhos dessa antiga árvore.

A mulher solitária e a casa grande

Depois de correr apressada
desesperada
cortando o tapete da sala, pisando pesado no piso
limpo na manhã passada
largou no fogo o ensopado coalhado
feito pro jantar passado
atendeu o telefone
com uma voz cansada
afinal, pelos tempos de vida
já estava avançada.

Mas ninguém respondeu.

Quem poderia ser numa hora dessas?

Espelho

Eu tenho as sombras pra esquecer das cores
eu uso as notas pra calar a voz de Deus
eu não me expresso bem
não tenho tempo de correr atrás do tempo perdido

Disfarço e piso numa flor
confesso, eu sou um grande ator
só atuo por aplauso, eu sou um falso, eu sei mentir bem
por um tempo eu me arrependo
passa logo, eu sei.

Distorço o que for capaz
não levo nenhuma mensagem de paz
não há nada que eu pense, que me faça sentir culpa.

De novo, nada.

A casinha no meio do vale

Enquanto corria por um campo sujo de medos
me vi perdido num emaranhado de sonhos
sonhos esses, que me traziam lagrimas desbotadas
preto e branco.

E como todos os dias, voltei cansado
pra dentro da minha casinha
com os pés sujos de cores velhas.